sexta-feira, 29 de abril de 2016




Presidente da Anasps Alexandre Barreto Lisboa fala sobre o Dia Mundial em Memória das Vítimas de acidentes e Doenças do Trabalho



Qual a importância de se destacar essa data?
Olha, qualquer data que você não esqueça aqueles que sofreram para uma evolução de alguma coisa tem que ser, não comemorada, mas celebrada porque hoje nós temos condições muito melhores do que no começo da indústria no mundo. A Revolução Industrial e tudo mais teve um aspecto muito positivo do avanço da tecnologia, do aumento da produção, do aumento do emprego, mas nós sabemos também que a disputa capital/trabalho era muito injusta. Os barões das indústrias exploravam seus trabalhadores, davam condições mínimas, não davam nenhuma proteção na hora da incerteza, na hora de uma doença, e principalmente na hora do acidente. Não havia equipamento de proteção. Todo avanço ocorrido no mundo vem das lutas constantes das entidades de classe, em prol dessa melhoria e para que essas pessoas não fiquem esquecidas, que o seu sacrifício não seja em vão, que o trabalhador – aquele que leva comida para sua casa, tenha uma garantia mínima de poder voltar -, que o trabalho seja satisfatório ou que seja seguro. Então é muito importante essa data para que possamos lembrar de tudo isso e fazermos uma reflexão, vermos o que acertamos e o que erramos para que com os acertos e os erros o sistema seja aprimorado.

Ainda são altos os números de acidentes contabilizados pelo MTPS. Como a Anasps avalia essa situação?
Avalia como preocupante porque como nós sabemos o acidente de trabalho pode ser por uma gama de situações: aquele ocorrido no seu local de trabalho, aquele ocorrido no seu deslocamento da sua residência ou trabalho ou no deslocamento externo para algumas atividades da empresa, assim como também as doenças profissionais e as doenças decorrentes do trabalho – porque elas têm uma diferença. Então um número desse ele tem que ser olhado com preocupação, visto todos esses pontos. Porque o que a gente tem visto hoje em dia: transportes públicos deficientes, então o trabalhador se arrisca indo e voltando em muitas localidades. Nós temos uma falta de fornecimento por algumas empresas de equipamento de proteção individual. Então nós temos esse risco. Nós temos empresas que utilizam equipamentos obsoletos que não correspondem as necessárias normas de segurança do trabalho, então essas pessoas correm o risco, mas precisam trabalhar. Trabalho acima do período necessário que isso vai causar aquelas doenças do trabalho (nós temos esses problemas também), então tudo isso tem que ser consertado, seja através de fiscalização, seja através de conscientização, seja através de linhas do governo, de crédito para melhoria, seja através de tributos mais pesados para aquelas empresas que de fato não cumprem as normas. Mas tem que ser realmente uma coisa pesada, uma coisa séria, que seja mais caro não proteger do que proteger. Até mesmo isenções para aquelas empresas que fazem as boas práticas, essa empresa tem que ser estimulada a fazer isso, tem que ter isenções fiscais, ela tem que ter linhas melhores para poder se modernizar... Enfim, tudo o que você puder vir a fazer para que o trabalho seja seguro é válido.   

Qual seria a solução para diminuir ou minimizar o atual cenário (que digamos, é grave)?
Eu acho que você só conserta alguma coisa pela consciência e pela educação ou punindo. Nós temos duas vertentes. O empresário tem que ser conscientizado de ser um bom empresário e o trabalhador também porque muitas das vezes o trabalhador acha que aquele equipamento não é necessário, que ele não precisa daquilo, então acontece também. Nós temos os dois lados que precisam ser educados, e se não cumpridas suas metas, serem punidos.

Esses números revelam que além de devastar inúmeras famílias (com o acidente, lesão, mutilação ou morte do trabalhador), impactam diretamente nos cofres do governo, que tem que arcar com os prejuízos por falta de prevenção e segurança...
Como uma coisa se relaciona com a outra, quando você não faz o que é devido alguém fica com o prejuízo. Se você gasta mais para consertar, não sairia mais barato para prevenir? Você ter uma fiscalização mais efetiva, você ter servidores mais conscientizados, capacitados, treinados para fiscalizar as empresas. Políticas de combate ao acidente mostrando o que é certo o que é errado, mostrando as boas práticas. Se isso não acontecer, o governo acaba sendo também penalizado. O Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) arrecada R$ 27 bilhões ao ano e esse dinheiro tem que ser melhor bem empregado. Tem que ser visto se ele é suficiente ou não e se ele é utilizado conscientemente. Eu acho que a sociedade como um todo tem que parar para repensar isso que acontece e ver as melhores soluções.

A insuficiência no quadro dos auditores-fiscais do Trabalho, conforme destacou o último levantamento realizado pelo IBGE, é um dos fatores que contribui para o aumento dessa triste estatística, não?!
Eu acho que quando você não tem uma política de conscientização muito grande, você tem que ter uma política de fiscalização. Se hoje os números estão altos, você tem que ter alguém quem vá de empresa em empresa verificar o fator acidentário para descobrir o que está acontecendo. Quais estudos estão sendo feitos com isso? Tem algumas áreas, assim com a área automobilística, a área de oficinas, tem acidentes muito grandes. Está faltando fiscalização. Está faltando uma conscientização. Então de fato esse é um fator que eu também comungo com os dados divulgados pelo IBGE. Precisamos de mais fiscais, nós precisamos de mais gente orientando e coibindo as práticas ruins.

Contudo, é possível celebrarmos essa data? Quais seriam as garantias num futuro-próximo ideal para trabalhadores que atuam em áreas de risco?
A gente tem que celebrar sim porque é uma lembrança. É um momento que você identifica que houveram vítimas. Se hoje você tem um equipamento de proteção individual é porque alguém no passado não teve. Se hoje você tem necessidades de alguns controles e certos maquinários de trabalho, regras de conduta é porque pessoas se sacrificaram e pessoas morreram tragicamente por isso. Então você ter uma data em que pelo menos haja esse reconhecimento, essa reflexão, é extremamente necessário para que as próximas gerações tenham isso como marco e, que pelo menos nessa data se faça uma reflexão do que está acontecendo. Vai ser tão bom se a gente poder chegar um dia numa data dessas e dizer assim: nós temos um índice mínimo porque nós cumprimos as etapas necessárias.


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