Presidente da Anasps Alexandre Barreto Lisboa fala sobre o Dia Mundial em Memória das Vítimas de acidentes e Doenças do Trabalho
Olha, qualquer data que você não esqueça aqueles que
sofreram para uma evolução de alguma coisa tem que ser, não comemorada, mas
celebrada porque hoje nós temos condições muito melhores do que no começo da
indústria no mundo. A Revolução Industrial e tudo mais teve um aspecto muito
positivo do avanço da tecnologia, do aumento da produção, do aumento do
emprego, mas nós sabemos também que a disputa capital/trabalho era muito
injusta. Os barões das indústrias exploravam seus trabalhadores, davam
condições mínimas, não davam nenhuma proteção na hora da incerteza, na hora de
uma doença, e principalmente na hora do acidente. Não havia equipamento de
proteção. Todo avanço ocorrido no mundo vem das lutas constantes das entidades
de classe, em prol dessa melhoria e para que essas pessoas não fiquem
esquecidas, que o seu sacrifício não seja em vão, que o trabalhador – aquele
que leva comida para sua casa, tenha uma garantia mínima de poder voltar -, que
o trabalho seja satisfatório ou que seja seguro. Então é muito importante essa
data para que possamos lembrar de tudo isso e fazermos uma reflexão, vermos o
que acertamos e o que erramos para que com os acertos e os erros o sistema seja
aprimorado.
Ainda são altos os números de acidentes
contabilizados pelo MTPS. Como a Anasps avalia essa situação?
Avalia como preocupante porque como nós sabemos o
acidente de trabalho pode ser por uma gama de situações: aquele ocorrido no seu
local de trabalho, aquele ocorrido no seu deslocamento da sua residência ou
trabalho ou no deslocamento externo para algumas atividades da empresa, assim
como também as doenças profissionais e as doenças decorrentes do trabalho –
porque elas têm uma diferença. Então um número desse ele tem que ser olhado com
preocupação, visto todos esses pontos. Porque o que a gente tem visto hoje em
dia: transportes públicos deficientes, então o trabalhador se arrisca indo e
voltando em muitas localidades. Nós temos uma falta de fornecimento por algumas
empresas de equipamento de proteção individual. Então nós temos esse risco. Nós
temos empresas que utilizam equipamentos obsoletos que não correspondem as
necessárias normas de segurança do trabalho, então essas pessoas correm o
risco, mas precisam trabalhar. Trabalho acima do período necessário que isso
vai causar aquelas doenças do trabalho (nós temos esses problemas também),
então tudo isso tem que ser consertado, seja através de fiscalização, seja
através de conscientização, seja através de linhas do governo, de crédito para
melhoria, seja através de tributos mais pesados para aquelas empresas que de
fato não cumprem as normas. Mas tem que ser realmente uma coisa pesada, uma
coisa séria, que seja mais caro não proteger do que proteger. Até mesmo
isenções para aquelas empresas que fazem as boas práticas, essa empresa tem que
ser estimulada a fazer isso, tem que ter isenções fiscais, ela tem que ter
linhas melhores para poder se modernizar... Enfim, tudo o que você puder vir a
fazer para que o trabalho seja seguro é válido.
Qual seria a solução para diminuir ou minimizar o
atual cenário (que digamos, é grave)?
Eu acho que você só conserta alguma coisa pela
consciência e pela educação ou punindo. Nós temos duas vertentes. O empresário
tem que ser conscientizado de ser um bom empresário e o trabalhador também
porque muitas das vezes o trabalhador acha que aquele equipamento não é
necessário, que ele não precisa daquilo, então acontece também. Nós temos os
dois lados que precisam ser educados, e se não cumpridas suas metas, serem
punidos.
Esses números revelam que além de devastar inúmeras
famílias (com o acidente, lesão, mutilação ou morte do trabalhador), impactam
diretamente nos cofres do governo, que tem que arcar com os prejuízos por falta
de prevenção e segurança...
Como uma coisa se relaciona com a outra, quando você
não faz o que é devido alguém fica com o prejuízo. Se você gasta mais para
consertar, não sairia mais barato para prevenir? Você ter uma fiscalização mais
efetiva, você ter servidores mais conscientizados, capacitados, treinados para
fiscalizar as empresas. Políticas de combate ao acidente mostrando o que é
certo o que é errado, mostrando as boas práticas. Se isso não acontecer, o
governo acaba sendo também penalizado. O Seguro de Acidente do Trabalho (SAT)
arrecada R$ 27 bilhões ao ano e esse dinheiro tem que ser melhor bem empregado.
Tem que ser visto se ele é suficiente ou não e se ele é utilizado
conscientemente. Eu acho que a sociedade como um todo tem que parar para
repensar isso que acontece e ver as melhores soluções.
A insuficiência no quadro dos auditores-fiscais do
Trabalho, conforme destacou o último levantamento realizado pelo IBGE, é um dos
fatores que contribui para o aumento dessa triste estatística, não?!
Eu acho que quando você não tem uma política de
conscientização muito grande, você tem que ter uma política de fiscalização. Se
hoje os números estão altos, você tem que ter alguém quem vá de empresa em
empresa verificar o fator acidentário para descobrir o que está acontecendo.
Quais estudos estão sendo feitos com isso? Tem algumas áreas, assim com a área
automobilística, a área de oficinas, tem acidentes muito grandes. Está faltando
fiscalização. Está faltando uma conscientização. Então de fato esse é um fator
que eu também comungo com os dados divulgados pelo IBGE. Precisamos de mais
fiscais, nós precisamos de mais gente orientando e coibindo as práticas ruins.
Contudo, é possível celebrarmos essa data? Quais
seriam as garantias num futuro-próximo ideal para trabalhadores que atuam em
áreas de risco?
A gente tem que celebrar sim porque é uma lembrança.
É um momento que você identifica que houveram vítimas. Se hoje você tem um
equipamento de proteção individual é porque alguém no passado não teve. Se hoje
você tem necessidades de alguns controles e certos maquinários de trabalho,
regras de conduta é porque pessoas se sacrificaram e pessoas morreram
tragicamente por isso. Então você ter uma data em que pelo menos haja esse
reconhecimento, essa reflexão, é extremamente necessário para que as próximas
gerações tenham isso como marco e, que pelo menos nessa data se faça uma
reflexão do que está acontecendo. Vai ser tão bom se a gente poder chegar um
dia numa data dessas e dizer assim: nós temos um índice mínimo porque nós
cumprimos as etapas necessárias.
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